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coluna no Globo

O risco de Temer

O presidente interino, Michel Temer, dará um tiro no pé se incentivar a proposta de ser candidato em 2018. Sua melhor chance é trabalhar pelo seu legado, iniciando a superação da pior crise das últimas décadas, e depois encerrar a carreira e ir para casa. Se entrar na disputa, continuará fazendo um governo ambíguo, e o momento é delicado demais para isso.

É natural que o grupo que se empoderou por orbitar em torno dele queira a continuidade, mas ele tem poucas chances. É um político sem carisma, ruim de voto, que já demonstrou não estar atualizado com certos valores e a agenda do mundo atual. Um sinal disso foi a falta de mulheres no ministério, em um tempo em que a homogeneidade masculina é impensável em qualquer governo do mundo democrático.

Ele chegou à presidência graças ao PT. Por estar na chapa com Dilma, recebeu os votos petistas, parte dos votos do PMDB e ficou na posição estratégica na qual assumiu interinamente o cargo. Não é um homem sem votos, como diz o PT. Ele os teve, mas, claro, se não fosse a ajuda petista não chegaria onde está.

Sua força deriva do fato de que ele tem dito que não será candidato e que sua ambição é fazer um bom governo. Deve continuar focado nisso. A crise é grave demais. Do ponto de vista fiscal, essa é a pior crise de que se tem notícia. O país está naturalizando alguns números que são espantosos e inaceitáveis, como o 10% de déficit nominal. Esse nível de descontrole traz consigo o risco de um colapso da dívida pública. O país precisa dramaticamente indicar a reversão futura da trajetória da dívida, que saltou, desde que Dilma assumiu, de 52% para 68% do PIB. As projeções indicam que ela já adquiriu uma dinâmica que a levará a 80% do PIB. É a rapidez da elevação, mais do que o número em si, que pode provocar a fuga de grandes investidores.

Do ponto de vista social, a situação é dramática: cinco milhões de brasileiros ingressaram no exército de desempregados desde que a presidente Dilma Rousseff foi reeleita. São agora 11,5 milhões de brasileiros batendo nas portas das empresas sem encontrar emprego. O país está perdendo em dois anos quase sete pontos percentuais do Produto Interno Bruto. A pior queda desde que o Brasil passou a ter essa estatística no começo do século passado. Uma perda desse tamanho só ocorre quando alguma calamidade atinge o país.

As maiores empresas estão com um alto nível de dívida e alguns conglomerados tentam fazer a reorganização corporativa com os antigos CEOs presos em complexos penais ou em casa. Os passivos potenciais em bancos e em empresas são altos e ainda não totalmente dimensionados.

O país precisa de reformas que foram postergadas. Há pouca chance de que sejam aprovadas na dimensão exigida para se fortalecer o mercado de trabalho, evitar o colapso do sistema previdenciário e sanear as contas públicas. Essa pequena chance só será realizada se o governante não tiver outras ambições a não ser a de conduzir essas batalhas. Se passar a governar com olho em um mandato seguinte, Michel Temer vai repetir o que tem feito atualmente: toma uma decisão numa direção, e outra em direção oposta. Essa ambiguidade levará seu projeto ao fracasso.

A crise não acabará no horizonte deste mandato. Os erros da administração petista foram graves demais. Precisarão ser corrigidos para que o país retome seu projeto de crescimento sustentado e com redução da pobreza e desigualdade. Mas Michel Temer pode almejar o comando do processo que corrigirá a rota e colocará o país de volta ao caminho virtuoso. Isso já é um trabalho imenso. Só conseguirá realizá-lo se focar nos problemas imediatos, sem olhar para 2018.

Temer ouvirá de seus áulicos que será possível, que se ele tiver sucesso será o líder natural desse grupo. A situação econômica não deixará de ser grave, mas terá uma mudança de humor no ano que vem, porque o PIB vai parar de cair. Temer pode se enganar com esse clima mais favorável e achar que será vitorioso em 2018. Aí mora o perigo, porque o que ele tem que vencer é 2017: um ano sem eleição e crucial para superar os muitos gargalos que estagnaram o Brasil. Antes, ainda terá setembro de 2016, que definirá a sorte do seu governo.

(Com Alvaro Gribel, de São Paulo)

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